Morte no Morro

Moro ao lado do morro
Onde morre a esperança preta
Alitero inteiro, sem pejo, os
Ais de desoladas mães privadas
Farda de luto farto 
Bandido vestido pelo estado
Luto lauto, carmesim líquido
   dos banidos do estado
Rio de sangue de Janeiro
Jorra no morro que morre
Um dia por vez, todo mês
   do começo ao ano inteiro
Cidade Maravilhosa -?-
Ouvidos surdos, olhos cegos
De calos a voz calada
   mas somente quando quer
– Duvido, discordo

Wisley Vilela

21/07/2022

Contextualizando o poema…

Semana passada, quando voltava de uma clínica no sopé do Morro do Alemão, o ruído de uma sirene abriu caminho para uma viatura até a entrada de emergência.
Quando passei naquela entrada, uma senhora de mais ou menos minha idade se entregava a um pranto inconsolável. A insensibilidade das pessoas ao redor, especialmente dos homens fardados na viatura, desceu rasgando.

Hoje, desde o amanhecer, o ruído das máquinas de helicópteros é praticamente ininterrupto. Lembrei das aulas do Bernardo Carvalho, em Filosofia da Educação, e das ações que ele relatou em classe, reaçando a importância dos trabalhos educativos nas comunidades de que o estado (inicial minúscula de caso pensado) parece apenas se lembrar que existem na prática de tiro-ao-alvo.
Fico aqui pensando em quantas mães perderam filhos neste 21 de julho.

Talvez eu não tenha voz nem lugar de fala. Ainda assim, preciso me expressar. Ainda assim, acho que todos deveriam se expressar contra a barbárie em curso.

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