O que é Linguística Aplicada

Responder a pergunta “o que é Linguística Aplicada?” pode ser uma tarefa desafiadora. As respostas de um grupo de dezessete alunos de mestrado e doutorado, na Faculdade de Letras da UFRJ, que não estava preparado para oferecer uma definição, apresentaram um largo espectro de possibilidades. O ponto comum nas diferentes respostas foi a inclusão da ideia de ‘conceito difuso’. Se para os alunos de cursos de Letras de uma renomada universidade é difícil elaborar uma definição clara de LA (Linguística Aplicada), é de se supor que a tarefa seja ainda mais desafiadora para pessoas não familiarizadas com essa área de estudos.

Seres humanos e sua necessidade incontrolável de categorizar, definir e etiquetar o mundo à sua volta. Se por um lado a categorização é benéfica e útil na compreensão das coisas, o conceito de ‘categorizar’ é intrinsecamente segmentador. Depois de ler trabalhos de vários pesquisadores da área sobre o que é LA, começo a compreender que a grande dificuldade de postular uma resposta a essa pergunta parece estar na natureza paradoxal da questão. A pergunta “o que é?” implica limites. Quando se pergunta “que dia é hoje”, ou “que horas são”, a resposta tem prazo de validade limitado. Um passageiro de trem que pergunta “que estação é esta” tem uma resposta que só será verdadeira por poucos minutos. Algo similar parece acontecer com a LA, que ao longo de sua recente história passou por viradas importantes que afetaram sua identidade epistemológica. A existência da LA tem sido dinâmica e isso desafia a condição até certo ponto estática implícita na pergunta “o que é?”.

Além do aspecto dinâmico-temporal da LA, que dificulta uma definição nos moldes estáticos de outras áreas tradicionais de pesquisa linguística, a ideia de limites que a pergunta “o que é?” contém contradiz a natureza “indisciplinar” (Moita Lopes), inter e transdisciplinar, transgressiva (Pennycook), da desaprendizagem (Branca Fabrício) da Linguística Aplicada. A LA não se restringe a uma área específica de conhecimento. A natureza das respostas que ela procura está mais no campo das relações entre entidades do que no campo da descrição de verdades absolutas. Como essas relações estão em constante mudança, assim também está a LA para se ajustar a novas realidades em sua multidisciplinar busca da compreensão de fenômenos linguísticos.

Se usássemos o jogo de xadrez como metáfora, o estudo das relações de poder na hierarquia das peças do jogo e dos métodos de exploração de vulnerabilidades, defesas e técnicas de dominação, em cenário de incontáveis possibilidades, seria análogo ao papel desempenhado pela LA na compreensão do mundo ao nosso redor.

E se, em lugar de perguntar “o que é Linguística Aplicada?”, a gente perguntasse “o que faz a Linguística Aplicada”? O professor Moita Lopes sugere uma definição concisa e abrangente ao dizer que entende a LA como “um modo de criar inteligibilidade sobre problemas sociais em que a linguagem tem papel central”. Essa criação de inteligibilidade seria alcançada através da análise das interações e relações da linguagem com um número expressivo de disciplinas em diversas áreas de conhecimento, que é o que a LA faz. Daí, Linguística aplicada (in)disciplinar, como defende o professor Moita Lopes e outros estudiosos.

Para saber mais, consulte os artigos abaixo.

CAVALCANTI, M.C. A propósito de Linguística Aplicada. In: Trabalhos em Linguística Aplicada 7: 5-12, 1986.

CELANI, M.A.A. Afinal, o que é Linguística Aplicada. In: PASCHOAL, M.S.Z. & CELANI, M. A. (Orgs) Linguística Aplicada: da aplicação da linguística à linguística transdisciplinar. São Paulo: EDUC-PUCSP, 1992, pp. 15-23

MENEZES, V.; SILVA, M. M.; GOMES, I.F. Sessenta anos de Linguística Aplicada: de onde viemos e para onde vamos. In: PEREIRA, R.C.; ROCA, P. (Org) Linguística aplicada: um caminho com diferentes acessos. São Paulo: Contexto, 2009, pp 25-50.

MOITA LOPES, L.P. – Da Aplicação de Linguística à Linguística Aplicada Indisciplinar. In: PEREIRA, R.C.; ROCA, P. (Orgs) Linguística aplicada: um caminho com diferentes acessos. São Paulo: Contexto, 2009, pp 11-24


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