Foto: Dr. Roman Jakobson (à esquerda) e C. Levi-Strauss (Photo by Keystone-France/Gamma-Keystone via Getty Images)

O Modelo Triádico da Tradução

Em 1959, Roman Jakobson estabelece uma distinção entre “três modos de interpretação do signo verbal: ele pode ser traduzido em [1] outros signos da mesma língua, em [2] outra língua, ou em [3] outro sistema não verbal de símbolos”. Como exposto brevemente na seção sobre terminologia (p. 42), o autor sugere as etiquetas “tradução intralingual”, para o primeiro modo de interpretação; “tradução interlingual”, para o segundo; e “tradução intersemiótica, ou transmutação”, para o terceiro modo (JAKOBSON, 1959, p. 233). Para Jakobson, o material linguístico, ou o modo textual verbal, estaria sempre presente como código (fonte ou meta) em tradução. Jakobson reconhece, entretanto, o papel de sistemas não verbais de símbolos no fazer tradutório. Ou seja, ele admitia a possibilidade de tradução para além da linguagem verbal.

Os sistemas não verbais de símbolos englobam textos dos modos visual e aural. Naturalmente, modo verbal pode também ser descrito como visual ou como aural (portanto, multimodal), se percebido a partir da imagem da escrita ou do som produzido na fala. Jakobson (ibidem) faz distinção entre verbal e não verbal pela escolha do termo “signo”, para referir à comunicação verbal, e “símbolo”, para a não verbal. Jakobson não explica o motivo para tal distinção, mas parece sugerir a transcendência da barreira linguística, em sua acepção verbal. A proposição concisa de Jakobson é fundamental para a fase primordial dos Estudos da Tradução, que sequer haviam sido reconhecidos como disciplina autônoma, à época.

O modelo triádico de Jakobson, uma referência notável para os Estudos da Tradução, foi revisitado por Hongwei Jia, em artigo publicado em 2017. O autor afirma que Jakobson ancora seu modelo nas oposições binárias do estruturalismo, que seriam incompatíveis com as relações semióticas dinâmicas e triádicas propostas por Charles Peirce, as quais teriam sido o ponto de partida de Jakobson. Além disso, Jia ressalta que Jakobson enfraquece a relevância entre objeto e interpretante na relação semiótica triádica e se mantém confinado àquelas oposições binárias. Por fim, antes de declarar a divisão de Jakobson (tradução interlingual, intralingual e intersemiótica) inadequada, Jia argumenta que Jakobson ignorara o fator humano na tradução intersemiótica (JIA, 2017, p. 43-44). É imperativo salientar, porém, que os estudos de Jakobson datam de meados do século XX, nos primórdios dos Estudos da Tradução.

As críticas incisivas de Jia, por mais pertinentes que sejam, desconsideram o escopo dos escritos e a época em que estes foram assentados. Seria surpreendente se os quase sessenta anos de estudos que decorreram desde Jakobson até os escritos de Jia não tivessem trazido à tona novos enfoques e ideias sobre os Estudos da Tradução. Como observado por Dinda Gorlée, nos anos 1950, as “traduções intralingual, interlingual e intersemiótica eram possibilidades teóricas novas para a compreensão de um texto-signo fonte transposto e meta-criado em um texto-signo alvo” (GORLÉE, 2010, n.p.). O paradigma tradutório proposto por Jakobson seria um ponto de partida, ao invés de uma solução definitiva para a análise de diferentes tipos de tradução. Para Gorlée, a “tradução intersemiótica é uma operação sequencialmente triádica, ou mesmo mais complexa, por envolver a união de traduções intermidiais em uma tradução incorporada” (ibidem). A autora argumenta que os termos originalmente propostos por Jakobson não contemplam a tradução de signos textuais não linguísticos em linguísticos, nem a tradução entre signos não verbais, aparentemente porque a relevância dessas operações continuou secundária até o final do século vinte (ibidem, nota 5).